terça-feira, março 06, 2007

Casa grande e senzala

Ele perambulava por toda a fábrica, mas nunca se sabia como é que chegava. Não se sabia porque sua cabeça se inclinava de tal forma que a vista apontava direto ao chão. Conhecia as rachaduras no piso decor. Toda vez que era bipado, colocava o cinto cheio de ferramentas nas quais duas ou três seriam suficientes para todo o trabalho. Não corria. Por maior que fosse o desespero, não corria. Dia desses chegou na máquina, levantou os olhos para o operador e disse:

- O que foi?
- Não sei. Eu tava trabalhando normal aqui e parou do nada. Não funciona porra nenhuma. O Moreira tá puto comigo porque a máquina ficou parada a semana toda. Não dá pra dar um jeito não?
- Eu preciso de um dia. Em um dia eu dou um jeito. Vocês nunca me dão um dia, então que fique quebrando.
- Eu não posso, liga pro Moreira e pede.
- Não vou pedir porra nenhuma, o desgraçado grita até com a mãe.
- Eu vou avisar que a máquina parou então.

Joaquim ficou olhando a máquina. Sabia o que era e precisava de um dia. Voltou ao seu setor e pegou o que era necessário para o trabalho. Quando voltou, topou com o Moreira gritando com o operador:

- Ele não arrumou essa porra ainda?

Ele ficou atrás do Moreira, olhando. O Moreira era um maldito que não entendia nada e por causa disso compensava com rudeza e potência de voz. Mas com o Joaquim ele não gritava, tinha medo do olhar rancoroso do eletricista. Quando o chefe percebeu que Joaquim estava ali, virou gentilmente e perguntou:

- Quanto tempo a máquina vai ficar parada?
- Eu preciso de um dia.
- Um dia? Não tem como dar um jeito? Um dia é muito porra! O seu Alex vai ficar doido. Dá um jeito aí Joaquim. Não dá pra essa máquina ficar parada. Se não der, liga você para o seu Alex e informa.
- Eu vejo se dou um jeito.

Joaquim abaixou a cabeça e seu Moreira saiu resmungando. O operador olhou para ele e disse:

- É Joaquim. A gente precisa de máquina porque senão o cliente reclama.
- Que cliente o caralho! Você é uma porra de um peão, nem sabe o nome do maldito engravatado que encheu o cú do seu chefe de dinheiro. Não fica me falando merda.

O operador ficou resmungando igual ao seu Moreira.
O telefone tocou. era seu Alex. Queria falar com o "rapaz da manutenção".

- Viu, o Moreira me disse que você quer um dia?
- Não precisa mais não seu Alex, eu dei um jeito aqui.
- Ah bom! Eu achei que já ia ter que te internar num manicômio! Já está virando a máquina então?
- Já.
-Ótimo.

Joaquim desligou o telefone, escolheu a chave de fenda que menos usava no seu cinto, cravou a ferramenta no painel da máquina e disse:

- Pode virar agora. Amanhã a gente se vê de novo.

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