sábado, fevereiro 03, 2007

Ponto final

Já fazem duas noites que não durmo direito. Não sei se é o calor ou o novo colchão. Durmo mal e acordo cedo. Todos os dias, de segunda à sexta.
Trabalho na cidade vizinha porque aqui não tem oportunidade. Falta vaga, o salário é baixo e esse emprego veio a calhar.
Pego o ônibus às 6h20min. Para isso, acordo às 5h. Quando mato o banho, levanto às 5h30min. De tanto ir e vir já conheço motorista, cobrador, passageiros. Destes não sei o nome, porque também não sou de conversa.
Entro e sento sempre na 31. Treze é meu número de sorte, mas há quem diga que é mau agouro. Então optei pelo 31.
Muitas vezes durmo. Noutras tantas só finjo. Quando o sono não vem começo o paciente serviço de observação.
Não, não observo a paisagem. Observo as pessoas. E hoje, justamente hoje, apareceu um passageiro incomum.
Não era comum somente porque não se portava como a maioria. Não dormiu. Não leu. Não usou seu MP3 player (tecnomordenice, que aderi com custo).
Voltando ao passageiro-personagem, é bom lembrar que se tratava de um homem. Vestia branco: bermuda, camiseta e meias. Calçava tênis. Ia sentado na poltrona do corredor, com uma sacola na mão.
Logo atrás de mim, vinha um sujeito do tipo “chato” e inconveniente. Enquanto observava o outro, este berrava no celular.
Fechei a revista que lia. Não conseguia me concentrar. Era o falatório de trás e a figura sentada no banco do corredor.
Quando a conversa ao telefone acabou, alguém continuava falando. O sujeito do corredor mudara-se para a janela e conversava sozinho. Esforcei-me para ouvir, mas nada compreendia daquele diálogo. Mas o rapaz conversava. Em seus braços e pernas haviam marcar vermelhas, purulentas e feridas. Ele se coçava. Ergueu até mesmo a camiseta branca para coçar a barriga. Houve festa de pernilongos nas noites passadas. Ou queria acreditar que assim havia sido.
Pensei com meus botões: “de onde esse sujeito apareceu?”. E também “para onde ele está indo?”.
Fato é que jamais saberei a resposta. E assim acontece todos os dias, sempre que chego no ponto final.

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