sábado, janeiro 27, 2007

Maria de Lourdes

Apesar do serviço doméstico, de lavar e passar roupas, cozinhar, lavar louças, de fazer faxina e criar os filhos, apesar de que, terminada a limpeza, já chegava no dia seguinte o momento de recomeçá-la, sim, apesar das mãos calejadas e das queimaduras de óleo quente nos antebraços, das varizes azul-celeste nas pernas de coxas grossas e quadril largo, apesar dos olhos de peixe nos pés e de uma ou outra unha encravada, e da iminente menopausa, apesar de passar por tudo isso com humor melhor que o do homem sentado à frente da tevê, era uma mulher frágil.

Não era dessas mulheres de se aventurar com homem qualquer. Tampouco de ficar muito tempo só. Chorava na juventude, e ainda hoje quando assistia a romances melosos em filmes ou novelas, ou quando o marido chegava tarde, fedendo a cigarro e cachaça barata, ainda que escondida. Antes, mandava-lhe cartas apaixonadas, em que borrifava um pouco de seu perfume barato de adolescente sonhadora, e dizia sempre que o amava ao que ele respondia com um grunhido, era mesmo apaixonada por ele. Não sabia o que faria sozinha.

Falava o tempo todo.

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